Já não dá para mais....
Amigos e visitantes do blog,
Eu peço mil desculpas mas infelizmente tive que apagar o meu post anterior “AAAAAAAHHHHH” sobre a amputação sofrida no livro que fiz para o EXPRESSO, mas é que enganei-me ao colocar as imagens e o template do blog estava desconfigurado e a barra de informações tinha ido parar algures.
Peço desculpa à Manuela, Félix, Mariana, Alice, José Saraiva e Elsa que tinham deixado comentários que agradeço pelo apoio e compreensão demonstrada.
No entanto como já estou mais calma (e não me importo de dizer que tive mesmo um ataque de choro, mas depois de cerca de 10 anos destas histórias, e livro sim, livro não
É sempre um desgaste pela falha das questões mais básicas no que diz respeito à concepção e edição de um livro infantil, desta vez foi mesmo por ter perdido a esperança numa mudança.) aproveito para explicar as coisas de outra forma para que quem não faz este trabalho possa compreender que chega uma altura em que o desgaste não compensa.
Como tinha explicado eu fiz as ilustrações para este livro para que fossem publicadas com um rebordo pintado, como uma nuvem, a aparecer sobre um fundo branco.
Os originais têm a medida exacta das páginas do livro, com mais 0,5cm a toda a volta para a margem de corte e eu desenhei cuidadosamente as miras, a central também e expliquei tudo na entrega do trabalho que aliás foi feito num prazo tão curto que me deixou exausta.A maquete também lá estava na ZEROAOITO. As ilustrações deveriam aparecer assim…
No entanto ontem quando abri o livro pela primeira vez tive a surpresa (má) de ver que as ilustrações tinham sido ampliadas para que a cor viesse até ao fim das páginas, o banco tinha desaparecido, o rebordo que pintei cuidadosamente e pior narizes,árvores, flores e outros pormenores estão completamente amputados.
Tudo sem eu saber, como quem corta as crostas do pão!
Fiquei de rastos.
Os meus contratos, que são feitos pela SPA (sociedade de que aliás não tenho a miníma queixa ,antes pelo contrário, no que diz respeito a zelarem pelo meu trabalho enquanto autora e aconselho vivamente a todos ilustradores que quiserem ter o seu trabalho protegido) dizem:
“ A EDITORA não poderá introduzir, sem o consentimento escrito da AUTORA, qualquer alteração às ilustrações por ela criadas. “
Ora eu não fui consultada sobre estas alterações nem vi as provas do livro. Não se trata de uma birra, mas de uma lei internacional de direitos de AUTOR.A lei existe deve ser cumprida.
Como em geral as pessoas acham que os ilustradores reclamam “de barriga cheia” e deixo aqui alguns pontos para uma melhor compreensão das razões porque o fazemos:
1. Um ilustrador de livro infantil, assim como um escritor, não recebe em geral como pagamento por um livro mais que 5% do preço de capa sem IVA sobre a venda de cada exemplar.
Em Portugal a média de uma edição é de 2000 exemplares, e mesmo assim por vezes subtrai-se 200 ou 300 exemplares que são para promoção e oferta e sobre os quais não há ganhos.
Basta pegar num livro numa livraria, ver o preço ,subtrair os 5% de Iva e já vêm quanto ganhámos.
Nem 1000€ numa edição! Mas continuamos a fazer livros porque gostamos. Um livro chega a ter 56 páginas, por vezes pintadas de uma ponta à outra. Num trabalho de meses que alternamos com outras coisas para sustentarmos o gosto de os fazer. Para quê?
2.Por essa razão lutamos pela promoção do livro e para que saia bem para que se possa vender e chegar a uma segunda e talvez terceira edição.
3.Um ilustrador planeia cuidadosamente um livro,ou assim deve fazer. É um texto visual e como tal queremos transmitir uma mensagem e temos assim também as nossas vírgulas,pontuações! Quando uma editora publica um livro mal digitalizado, mal impresso, de pernas para o ar, sem quatro páginas, de ilustrações cortadas como me aconteceu porque “Olha assim até não fica nada mal e ninguém nota”, sem nos consultar, sem perguntar se não queremos alterar porque assim o livro fica melhor por esta ou aquela razão, a mensagem chega ao público amputada.
É como querermos falar e taparem-nos a boca com a mão. E isso desculpem, mas dói. Ainda mais quando fizemos o melhor possível para que o trabalho fique bem.
4. Quando o público compra um livro e acha que mesmo assim está bonito é grave!
Primeiro porque está a ter acesso a uma obra amputada, depois porque está a ser educado para um gosto também amputado. E a culpa não é do público.
5. Quando um livro sai em más condições não tem hipóteses num concurso internacional,
nem a uma tradução para outro país, nem podemos juntá-lo a um portfolio para uma editora estrangeira. Os livros infantis portugueses raramente atravessam fronteiras.
Porque o mundo está cheio de livros bem impressos e com um bom design!
6. Para terem a noção um dos livros vencedores do RAGAZZI AWARDS de Bolonha deste ano era do RUANDA! Estava bem impresso, sem ilustrações cortadas.Foi comprado por editoras de vários países.É das EDITIONS BAKAME, vale a pena dar uma olhada no site da feira.
Não teremos nós a sorte de ter melhores condições de um país como o RUANDA?
Porque acontecem estas coisas em PORTUGAL?
7. De há dois anos para cá que trabalho com uma editora Espanhola e contacto com editores nos Estados Unidos.
A principio fiquei surpreendida, não só por perceber que a ILUSTRAÇÃO PORTUGUESA realmente existe com um carácter singular como também é bem acolhida e considerada BOA.Também porque sou sempre muito bem tratada e com um grande profissionalismo, por vezes até me sinto mimada tal é a compreensão demonstrada.
Não digo que estes problemas ou outros não aconteçam, já me aconteceu, mas bastou-me escrever uma carta dizendo que estava triste com o resultado de um livro e explicar as razões, para que o livro ter sido imediatamente retirado do mercado, reeditado de novo com todas as falhas que apontei corrigidas, um pedido de desculpas, um “obrigada por nos teres dito,precisamos de saber dessas falhas" e melhor ainda um “É um prazer trabalhar contigo”.
Fiquei surpreendida! Claro, por aqui somos mal vistos se abrimos aboca para reclamar daquilo que está certo!
É claro que eu sou um individuo e como tal não vou dizer a ninguém que desista de trabalhar no seu país, eu sei o que é melhor para mim, e cada um deve fazer o mesmo.
Durante este tempo eu achei que não devia desistir de publicar em Portugal, que o bom da experiência lá fora seria o de tentar mudar e trazer coisas novas cá para dentro. No entanto deixei de achar que valha a pena, enquanto não se souber o que é um Ilustrador, quais os seus direitos e que de facto é uma profissão reconhecida como qualquer outra estas questões vão continuar a acontecer. E eu não quero estar sempre a passar por isso.
Eu peço mil desculpas mas infelizmente tive que apagar o meu post anterior “AAAAAAAHHHHH” sobre a amputação sofrida no livro que fiz para o EXPRESSO, mas é que enganei-me ao colocar as imagens e o template do blog estava desconfigurado e a barra de informações tinha ido parar algures.
Peço desculpa à Manuela, Félix, Mariana, Alice, José Saraiva e Elsa que tinham deixado comentários que agradeço pelo apoio e compreensão demonstrada.
No entanto como já estou mais calma (e não me importo de dizer que tive mesmo um ataque de choro, mas depois de cerca de 10 anos destas histórias, e livro sim, livro não
É sempre um desgaste pela falha das questões mais básicas no que diz respeito à concepção e edição de um livro infantil, desta vez foi mesmo por ter perdido a esperança numa mudança.) aproveito para explicar as coisas de outra forma para que quem não faz este trabalho possa compreender que chega uma altura em que o desgaste não compensa.
Como tinha explicado eu fiz as ilustrações para este livro para que fossem publicadas com um rebordo pintado, como uma nuvem, a aparecer sobre um fundo branco.
Os originais têm a medida exacta das páginas do livro, com mais 0,5cm a toda a volta para a margem de corte e eu desenhei cuidadosamente as miras, a central também e expliquei tudo na entrega do trabalho que aliás foi feito num prazo tão curto que me deixou exausta.A maquete também lá estava na ZEROAOITO. As ilustrações deveriam aparecer assim…
No entanto ontem quando abri o livro pela primeira vez tive a surpresa (má) de ver que as ilustrações tinham sido ampliadas para que a cor viesse até ao fim das páginas, o banco tinha desaparecido, o rebordo que pintei cuidadosamente e pior narizes,árvores, flores e outros pormenores estão completamente amputados.
Tudo sem eu saber, como quem corta as crostas do pão!
Fiquei de rastos.
Os meus contratos, que são feitos pela SPA (sociedade de que aliás não tenho a miníma queixa ,antes pelo contrário, no que diz respeito a zelarem pelo meu trabalho enquanto autora e aconselho vivamente a todos ilustradores que quiserem ter o seu trabalho protegido) dizem:
“ A EDITORA não poderá introduzir, sem o consentimento escrito da AUTORA, qualquer alteração às ilustrações por ela criadas. “
Ora eu não fui consultada sobre estas alterações nem vi as provas do livro. Não se trata de uma birra, mas de uma lei internacional de direitos de AUTOR.A lei existe deve ser cumprida.
Como em geral as pessoas acham que os ilustradores reclamam “de barriga cheia” e deixo aqui alguns pontos para uma melhor compreensão das razões porque o fazemos:
1. Um ilustrador de livro infantil, assim como um escritor, não recebe em geral como pagamento por um livro mais que 5% do preço de capa sem IVA sobre a venda de cada exemplar.
Em Portugal a média de uma edição é de 2000 exemplares, e mesmo assim por vezes subtrai-se 200 ou 300 exemplares que são para promoção e oferta e sobre os quais não há ganhos.
Basta pegar num livro numa livraria, ver o preço ,subtrair os 5% de Iva e já vêm quanto ganhámos.
Nem 1000€ numa edição! Mas continuamos a fazer livros porque gostamos. Um livro chega a ter 56 páginas, por vezes pintadas de uma ponta à outra. Num trabalho de meses que alternamos com outras coisas para sustentarmos o gosto de os fazer. Para quê?
2.Por essa razão lutamos pela promoção do livro e para que saia bem para que se possa vender e chegar a uma segunda e talvez terceira edição.
3.Um ilustrador planeia cuidadosamente um livro,ou assim deve fazer. É um texto visual e como tal queremos transmitir uma mensagem e temos assim também as nossas vírgulas,pontuações! Quando uma editora publica um livro mal digitalizado, mal impresso, de pernas para o ar, sem quatro páginas, de ilustrações cortadas como me aconteceu porque “Olha assim até não fica nada mal e ninguém nota”, sem nos consultar, sem perguntar se não queremos alterar porque assim o livro fica melhor por esta ou aquela razão, a mensagem chega ao público amputada.
É como querermos falar e taparem-nos a boca com a mão. E isso desculpem, mas dói. Ainda mais quando fizemos o melhor possível para que o trabalho fique bem.
4. Quando o público compra um livro e acha que mesmo assim está bonito é grave!
Primeiro porque está a ter acesso a uma obra amputada, depois porque está a ser educado para um gosto também amputado. E a culpa não é do público.
5. Quando um livro sai em más condições não tem hipóteses num concurso internacional,
nem a uma tradução para outro país, nem podemos juntá-lo a um portfolio para uma editora estrangeira. Os livros infantis portugueses raramente atravessam fronteiras.
Porque o mundo está cheio de livros bem impressos e com um bom design!
6. Para terem a noção um dos livros vencedores do RAGAZZI AWARDS de Bolonha deste ano era do RUANDA! Estava bem impresso, sem ilustrações cortadas.Foi comprado por editoras de vários países.É das EDITIONS BAKAME, vale a pena dar uma olhada no site da feira.
Não teremos nós a sorte de ter melhores condições de um país como o RUANDA?
Porque acontecem estas coisas em PORTUGAL?
7. De há dois anos para cá que trabalho com uma editora Espanhola e contacto com editores nos Estados Unidos.
A principio fiquei surpreendida, não só por perceber que a ILUSTRAÇÃO PORTUGUESA realmente existe com um carácter singular como também é bem acolhida e considerada BOA.Também porque sou sempre muito bem tratada e com um grande profissionalismo, por vezes até me sinto mimada tal é a compreensão demonstrada.
Não digo que estes problemas ou outros não aconteçam, já me aconteceu, mas bastou-me escrever uma carta dizendo que estava triste com o resultado de um livro e explicar as razões, para que o livro ter sido imediatamente retirado do mercado, reeditado de novo com todas as falhas que apontei corrigidas, um pedido de desculpas, um “obrigada por nos teres dito,precisamos de saber dessas falhas" e melhor ainda um “É um prazer trabalhar contigo”.
Fiquei surpreendida! Claro, por aqui somos mal vistos se abrimos aboca para reclamar daquilo que está certo!
É claro que eu sou um individuo e como tal não vou dizer a ninguém que desista de trabalhar no seu país, eu sei o que é melhor para mim, e cada um deve fazer o mesmo.
Durante este tempo eu achei que não devia desistir de publicar em Portugal, que o bom da experiência lá fora seria o de tentar mudar e trazer coisas novas cá para dentro. No entanto deixei de achar que valha a pena, enquanto não se souber o que é um Ilustrador, quais os seus direitos e que de facto é uma profissão reconhecida como qualquer outra estas questões vão continuar a acontecer. E eu não quero estar sempre a passar por isso.
5 Comments:
Acabei de ler este texto e não resisti a deixar algo imediatamente. Apenas para te dizer que gostei imenso de tudo o que disseste e me revejo em quase todas as palavras. Resumiste exemplarmente o perfil da actividade em Portugal.
É incrível, imagino a tua frustração. Espero que consigas fazer com que a SPA tome medidas relativamente ao que aconteceu e que sejas compensada de alguma forma.
É realmente incrivel! E os rebordos das ilustrações estavam muito bonitos. Tens todo o meu apoio!
Levina, Lamento que diga que não faz sentido ter margens,primeiro porque não viu o projecto completo e como funcionava,depois porque elas resultavam bem assim,a seguir porque cada projecto era um só e eu podia desenvolve-lo como queria.
A ZeroaOito admitiu o erro e pediu desculpas, foi uma falha de comunicação interna.Forma muito simpáticos,mas eu tenho 20 000 exemplares de um livro cortado.
Mas além disso,Levina,as ilustrações foram todas ampliadas o que era desnecessário.O corte foi porque não sabiam ler as miras nem para que servem.
E para mim que tinha a liberdade do discurso que me deram,elas SIM fazem e faziam sentido com a margem branca à volta.Vocês não viram,não acho que tenham o direito de dizer se resultam ou não enquanto não tiverem acesso a todo o projecto completo e aos meus originais.
Diminuir dessa forma o que aconteceu e dizer que as margens brancas até eram desnecessárias é ainda mais triste e desmotivante, ler o post do André que o vem colocar depois de semanas de silêncio e ausência também o é.
só a ilustradora sabe se resulta ou não. se as fizeste assim assim é que estava bem... ora...
agora fiquei mesmo triste de ter um livro amputado... já não o consigo olhar da mesma forma. apesar de ser fã incondicional das tuas ilustrações. =)
mil beijinhos e espero que, enquanto designer, as coisas melhorem em portugal porque a questão da emigração para mim já fez menos sentido do que agora!
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